Depois de um dia daqueles, acordei com a minha cabeça estourando.
Olhei no relógio e ainda eram seis e meia da manhã. Billy ainda estava dormindo – numa casinha que Kaori fizera para ele no meu quarto – e, não conseguindo mais pegar no sono, decidi levantar.
Tirei meu pijama e vesti uma roupa comum. Desci para comer alguma coisa.
Na cozinha, peguei alguns biscoitos no armário e comi. Billy apareceu, sem fazer barulho.
- Bom dia, amigão – o cumprimentei. Ao invés de latir, ele chegou até mim e esfregou sua cabeça na minha perna. Abaixei e o acariciei. Depois decidi que precisava refletir. Mas eu não estava com a mínima vontade de ir ao parque perto da minha casa.
Pensei num outro lugar.
Uma intensa neblina cobria a bela manhã de sábado, enquanto eu caminhava pela rua deserta do meu bairro, acompanhado do meu cachorrinho. Eu estava indo à escola Matsumoto, mas não para estudar, e sim para refletir um pouco sobre a vida. No campus, especificamente.
Cheguei e um filme passou pela minha cabeça. Me lembrei de quando fui ao colégio pela primeira vez, onde eu via muitos desconhecidos conversando e se divertindo entre si. Eu era apenas um estranho, sozinho, sem amigos. Ninguém me notava. Entrei na escola, e fiquei perdido. Muitos passaram por mim sem nem sequer tentar me ajudar, menos… Shimizu. Ela foi muito gentil comigo naquele dia, o dia em que me apaixonei por ela. Depois conheci Natsuno, atualmente o meu melhor amigo. Ele era um cara de bem com a vida, sempre de bom-humor. Me tratava superbem, e até descobri que ele era um caçador de vampiros, assim como eu!
Havia muita neblina ainda, deixando o lugar deserto e, de certo modo, um pouco assustador. Caminhei em direção a um dos bancos do campus e me sentei. Eu estava de frente com o enorme edifício da escola. O banco ficava na praça, que era separada da escola apenas por uma estradinha – que era reservada aos pais que levavam ou buscavam seus filhos de carro. A estrada era estreita, pois só havia uma mão. No final dela a avenida, esta já mais larga e movimentada. A observei e, me recordando de alguns dias atrás, me lembrei do motoqueiro misterioso, que eu seguira por ali. Lembrei também de quando Shimizu ia embora, pelo mesmo caminho, na avenida, todos os dias. Senti um aperto no coração quando me lembrei dela.
Só depois de algum tempo eu percebi que, na outra ponta do banco, havia alguém sentado também. Era uma garota. Eu não conseguia ver quem era porque ela estava com a touca da sua blusa tampando praticamente todo o seu rosto e, ainda por cima, com a ajuda dos cabelos loiros cacheados.
A ignorei.
Comecei a pensar em Zoe e Shimizu, em como me explicaria com ambas e no que havia acontecido. Um encontro entre as duas, e da pior maneira possível. Eu aguardava a resposta da Shimizu quanto ao meu pedido de namoro, mas ela me evitava. Quando encontrei Zoe, a vi chorando e senti muita pena dela. Conversamos, tentei consolá-la, mas acabou que nos beijamos. E a Shimizu apareceu nesse exato momento! Ela viu Zoe e eu, e se decepcionou. Depois saiu correndo. Quase fui atrás e, quando me dei conta, Zoe também saiu correndo. No final das contas eu estava sozinho…
- Droga! – exclamei, em voz alta.
Foi aí que me surpreendi:
- Problemas amorosos? – perguntou a garota ao meu lado.
A olhei, surpreso. Quem era ela afinal? E como adivinhou?
Não sei o que deu em mim, mas respondi:
- Sim.
A garota ainda estava com a touca, me impedindo de ver seu rosto. Mas ainda assim pediu:
- Me conta a sua situação?
Hesitei. Mas ela insistiu:
- Pode confiar em mim. Quem sabe eu não consiga te ajudar – essas palavras me convenceram, eu só não sei por quê.
Decidi contar.
Contei tudo o que eu contara ao meu tio, desde a primeira vez que vi Shimizu até o beijo que ela vira meu e da Zoe. Contei também o que eu sentia nesse tempo todo. Minha cabeça começou a doer, enquanto eu me lembrava de tudo aquilo. A garota nunca me olhava, mas eu percebi que ela estava bem atenta. Era muito esquisita aquela situação, onde eu me abria com uma estranha que nem sequer mostrava seu rosto, mas, mesmo nem sabendo quem era, eu sentia que confiava nela. Mas por quê? Não sei.
Terminei.
Ela não falou nada, e ficamos em silêncio por algum tempo, até ela finalmente abrir a boca:
- Irônica sua situação – e riu; sua voz era rouca e muito calma.
“Irônica?”, pensei.
- O que você acha? – perguntei, olhando para a escola.
A garota respirou fundo e começou a falar, sem parar:
- Olha, pelo que você me disse, você está confuso entre duas garotas. Não é anormal estar confuso, mas percebo que você não sabe de quem você realmente gosta. Zoe e Shimizu são belas e doces, o que mexe com você. E apareceram de repente! Você pode até não saber de quem você gosta, mas eu sei.
Assim que ela falou isso, me surpreendi.
- Você sabe? – eu não acreditava naquilo.
- Claro! – a olhei, de boca aberta. – Tá tão na cara.
Tá tão na cara? Ri.
- Então me diz – pedi.
- Você gosta da Shimizu – imediatamente senti algo dentro do meu coração. A garota continuou: - Fubuki, o que você sente pela Zoe parece ser tão forte quanto o que você sente pela Shimizu, mas não. Você disse várias vezes que sabia, de certo modo, que o que sentia pela Shimizu era mais forte do que o que você sentia pela outra.
- Mas isso era antes – lembrei.
- Não importa. Seu sentimento pela Zoe aumentou só porque vocês se beijaram, e duas vezes! Agora imagine se você tivesse beijado a Shimizu… - ela estava certa nessa parte. – Ou seja, o que você sente pela Zoe não passa de uma forte atração. Você ama a Shimizu. Entende?
Aquela menina era surpreendente. Ela ouviu minha história e chegou a uma conclusão muito rápida! E ela estava certa! Mas outra coisa passou pela minha cabeça: ela falou meu nome, e não me lembro de tê-lo dito a ela. Decidi pedir algo à garota:
- Você poderia tirar a sua touca?
Ela respondeu de imediato:
- Claro! – e decidiu tirar. Meu coração batia de ansiedade, e eu estava louco para ver seu rosto. A neblina já abaixava e o sol brilhava mais forte. O lugar onde estávamos começava a ser “habitado”, mas nada tirava a minha atenção da garota estranha. Ela tirava a touca lentamente, até me mostrar seu rosto. Ela olhou para mim e sorriu.
Imediatamente eu me espantei!
- Você… - gaguejei, sem acreditar no que via, muito surpreso. – Você… é… a garota… do… - não consegui completar.
A menina sorria, olhando ironicamente para mim.
Seus cabelos loiros cacheados eram lindos. Sua pele bronzeada, macia. Seus olhos verdes ofuscavam a minha mente, e eu não conseguia falar nada!
Era o espirito que eu vira no fundo do rio! E em carne e osso!!
- Já me viu antes? – ela me perguntou ironicamente.
- Meu… meu… anjo da guarda – foi o que consegui falar; ela riu.
- Prazer, sou Ynna – e sorriu. Não consegui dizer nada, espantado com a sua presença. Quem era ela afinal? E como aparecera naquele dia, no fundo do rio, como espírito de anjo?! Eu não sabia o que falar, então perguntei:
- Quem é você?
- Já respondi – disse ela.
Ynna se levantou e saiu andando, enquanto eu mal conseguia me mexer, de tão surpreso que estava. Ynna… Esse era o nome dela. Mas como?
Billy latiu.
Eu já tinha me esquecido dele. Mas eu não conseguia mais raciocinar. Ynna aparecera pela segunda vez e, pela segunda vez, me ajudara. Uma ela meio que me deu forças para sair do fundo do rio – ou pelo menos eu achava isso –, e agora organizou meus sentimentos. Ela com certeza não era normal.
Me levantei.
- Hora de ir embora – falei ao cachorrinho vermelho; ele latiu.
O peguei no colo e caminhei rumo à minha casa. Olhei para o relógio e vi que eram quase oito horas da manhã. Eu estava satisfeito. Não sei por que, mas a presença dessa garota estranha me fez muito bem. Ela organizou meus sentimentos! Contei minha situação para ela e ela simplesmente me deu a resposta certa. Meu Deus, seria coisa do destino? Ynna… Ela realmente era o meu anjo da guarda? E será que eu a encontraria novamente? Eu não tinha certeza, mas sentia que a resposta era 'sim'.
Sorri.
Cheguei em casa, onde minha mãe acabava de descer a escada.
- Onde você estava, filho? – perguntou ela, bocejando. Provavelmente tinha acabado de acordar.
- Conversando com uma amiga – respondi.
Minha mãe estranhou, mas não disse nada. Eu também não, e fui direto para o meu quarto, fazer o que eu mais gostava de fazer: pensar.
- Que sábado maravilhoso! – gritei, enquanto subia a escada.
- Cala a boca, Fubuki – gritou meu tio, de seu quarto. – Tá cedo ainda para você ficar gritando pela casa!
Billy latiu, subindo ao meu lado.
Passei pela minha mãe, que me olhou. Parei, olhei para ela e perguntei:
- O que foi?
- Nada – ela riu. Continuei subindo, muito feliz com aquele "encontro".
"Ynna, te adoro!", falei a mim mesmo, sorrindo.
E assim foi a minha manhã de sábado.
Encontrei o anjo de novo! Mas quem é ela afinal? Uma garota que apareceu de repente na minha vida de um jeito estranho... E conseguiu desembaralhar a minha cabeça! Quer saber o que mais vai acontecer? Então veja nos próximos capítulos de "O Caçador de Vampiros".
Você não pode perder!
Acompanhem ^^
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